segunda-feira, 19 de julho de 2010

O menino ouve meu recado...

Fotos tiradas na segunda temporada de "Desterro"pelo fotógrafo Sorocabano Fabricio Vianna @fabriciovianna.




























































quinta-feira, 15 de julho de 2010

A MEIO-CAMINHO

POSTADO POR MICHEL VALVERDE http://daimonfilosofico.blogspot.com/

Partir e chegar, chegar e partir... Estar em algum lugar, e ao mesmo tempo viver o não-lugar. A partida traz no seu deslocamento as minúcias de uma vida, a nostalgia da despedida e a saudade dos momentos que fizeram valer a pena cada minuto do passado. E isso não é privilégio de ninguém, tampouco castigo para os desafortunados. Trata-se da mais comum e fatal aventura do homem: o exílio para o desconhecido. Inserido nessa dinâmica intransponível, ele conta com a memória, forte aliada contra a solidão e o desamparo.

Percorrendo esse universo, fatual e onírico, o espetáculo Desterro, do Coletivo Cê, apresenta a história e a lembrança de um jovem, cuja angústia pela vida perdida faz com que rememore, entre os anos decorridos do seu caminhar, os episódios mais importantes, causa de inspiração e pesar, e os embates de maior repercussão interior. O grupo sorocabano exibe no Casarão da CPFL (espaço da encenação) o suceder de vínculos e interrogações de um sujeito a procura de si próprio nas coisas, pessoas e afetos que participaram das etapas de sua vida.

Concebido como espetáculo itinerante, o público – não mais de vinte e cinco pessoas – é conduzido por alguns cômodos e pelo pátio, donde aprecia as cenas que formam o quebra-cabeça do consciente do protagonista, o jovem nômade. O elenco, bastante comprometido com o seu trabalho, alterna personagens e compõe também o coro musical que entremeia os blocos de representação. Em cena, o jovem se confronta com a alegoria do tempo, personificada como a memória que o introduz e retira ininterruptamente pelas entranhas da sua psique atormentada, sentida igualmente nos detalhes cenográficos e atmosféricos, propostos por uma iluminação parva e desfocada. Os objetos escolhidos, com características rústicas e bucólicas, traduzem com sucesso o anseio do protagonista de retornar ao local de segurança.

No fundo de tudo, a travessia pelas estações resididas (o café com a mãe, a colheita de mangas, a visita ao prostíbulo) remete à procura incessante pela identidade, princípio de toda atitude libertária, e a insistente recorrência aos fatos de outrora apenas ilustra o quanto essa lacuna urge em ser preenchida. Freud, em um de seus escritos, menciona a existência do sentimento “oceânico”, espécie de estado de plenitude que remete ao ilimitado, infinito, e tal é a expectativa de completude levantada pelo desdobrar das ações cênicas. Será possível alcançar a plena realização humana? Talvez essa condição eminente exija abdicações na mesma proporção das aquisições, e no limiar da falta e do acúmulo esteja o ponto de recomeço que lance cada indivíduo para horizontes mais promissores. Se pôr errante, e não ficar no meio do caminho, entre lamentações e culpa – eis uma inferência interessante de considerar.

Desterro cumpre com perícia a proposta de despertar nos espectadores a mesma busca do jovem protagonista: a tentativa de se ver pela própria história e de olhar para a distância vindoura, com coragem e desprendimento das amarras da alma, postas pelas fugas e decisões mal assimiladas. Prestigiar esse espetáculo é ter a decência de se enxergar num espelho e desafiar-se a rememorar quem se é, distinguindo as resoluções inevitáveis e as gaiolas das quais se pode e não se pode fugir.