terça-feira, 16 de março de 2010

Crítica Desterro Ingrid Koudela 07/03/10








DESTERRO do COLETIVO CÊ
por Ingrid Koudela


Estréia no Casarão da CPFL, primeiro edifício a fornecer energia elétrica para a cidade de Sorocaba, construído em 1915, o espetáculo DESTERRO.

A arquitetura do prédio, transformada agora em espaço cultural pelo COLETIVO CÊ dá luz à memória afetiva e social da cidade. O espectador é mobilizado pelos personagens herdados do tempo, fantasmas de outros tempos que evocam pessoas, objetos, acontecimentos passados naqueles cômodos. A exploração cênica dos vários ambientes visitados pela encenação conduz o espectador, realizando uma viagem no túnel do tempo. A empresa CPFL que cedeu o espaço torna assim viva a memória que só o teatro pode realizar. A iniciativa da LINC sorocabana merece elogios ao apoiar projetos de qualidade como DESTERRO e outros tantos que pudemos acompanhar nos últimos anos.

A dramaturgia recheada de cheiros da infância, brincadeiras, músicas, sensações e histórias dos avós, desejos e medos remotos de Janaina Silva e a direção segura de Julio Melo lideram as competências destes jovens atuantes sorocabanos, em sua grande maioria com formação universitária em teatro na UNISO. As contradições entre o passado/futuro, da criança/jovem que parte em busca de novos horizontes demonstram a partida necessária que simboliza a saída da casa paterna, o crescimento do menino e a saudade da identidade que permanecerá.

Através de um elenco de primeira grandeza, o encontro do personagem-menino de Hércules Soares emociona na sua relação sincera com as atrizes-mulheres. A figura da mãe, incorporada por Giuliana Abona traz desde a primeira cena no café da manhã o ambiente interiorano, invocando traços de Guimarães Rosa na linguagem e na construção da cena que traz os primeiros afetos do menino.

Eliane Ribeiro realiza um belíssimo trabalho ao alegorizar a personagem memória através de seus dotes com o teatro de animação. O canarinho na gaiola ao qual dá vida com movimentos de uma das mãos é inesquecível! Sua figura faz o comentário das cenas e conduz a platéia de vinte e cinco pessoas, publico admitido a cada noite em que se realiza o espetáculo.

O coro, interpretado por Mariana Alves, Andressa Machado, Giuliana Abona e Fernanda Brito canta invocando o tempo pretérito e a trajetória do menino desterrado da casa paterna. A bela voz de Fernanda Brito lidera o coro das putas assombrando com sua interpretação madura e brincalhona. A paisagem sonora dos cânticos toca o coração e a saudade. O temor pelo futuro do menino é presente e compartilhado pela platéia permanecendo uma interrogação...

Há espetáculos em que se ressaltam qualidades estas ou aquelas. Em DESTERRO a maior qualidade é o processo orgânico do Coletivo Cê que resulta em um espetáculo no qual as partes compõem um espetáculo genial!

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